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“Saímos da seção de meio ambiente para a de economia. E isso mudou a importância do debate.”

Cibele Lana 16 mar 2021

“Saímos da seção de meio ambiente para a de economia. E isso mudou a importância do debate.”

Importante plataforma dedicada a traduzir a ciência climática e tentar elevar o debate sobre o tema, o ClimaInfo é, sem dúvidas, uma iniciativa de importância nacional para a formação de uma consciência sobre mudanças climáticas, seja para a sociedade civil, seja para as instituições públicas ou privadas.

Délcio Rodrigues é o diretor executivo do Instituto ClimaInfo e foi nosso convidado para uma entrevista exclusiva sobre o Dia Nacional de Conscientização sobre Mudanças Climáticas.

Confira na íntegra.

 

EKOS BRASIL – O ClimaInfo vem atuando há bastante tempo para promover um debate qualificado em relação a temas relacionados às mudanças climáticas, energia, uso da terra e políticas públicas. Você acredita que, de modo geral, o debate sobre esses temas tem se tornado mais frequente e mais qualificado? 

Délcio Rodrigues – O debate teve uma evolução, embora, a coisa complique quando nos referimos a um debate qualificado. 

Um dos motores dessa discussão mais presente é o próprio negacionismo climático. Todos nos lembramos sobre o que foi feito contra o INPE nesta gestão, com o questionamento dos dados sobre emissões e desmatamento. Acontece que esse negacionismo também empurrou a imprensa a discutir esse negacionismo. Por isso, tivemos um outro nível de debate, talvez não de qualidade, mas de exposição do debate.  

Ano passado, na questão específica da Amazônia por exemplo, o mainstream da economia entrou no debate. Vimos ex-ministros e presidentes do Banco Central propondo uma nova política. Vimos investidores internacionais pressionando o Brasil. Vimos os CEOs do Itaú, do Santander e Bradesco na mesma direção. E tivemos uma elevação da pauta ambiente/clima: saímos da seção de meio ambiente para a de economia. E isso mudou a importância do debate. 

Hoje você vê um dos pré-candidatos falando da agenda climática como decisiva para (a eleição) de 2022. Tem mais informação, tem relevância do desmatamento da Amazônia para o comércio internacional brasileiro e tem também coisas acontecendo no plano do desenvolvimento tecnológico. 

EKOS BRASIL – Uma pesquisa recente mostrou que o brasileiro apresenta um bom grau de preocupação em relação às mudanças climáticas. Inclusive, mais de 70%, indicaram que as mudanças climáticas podem causar muitos prejuízos para suas famílias. Você acha que o brasileiro tem demonstrado preocupação e atitudes efetivas em relação ao tema no seu dia a dia?

A informação que temos dessa pesquisa diz que as pessoas respondem afirmativamente essas questões. O negacionismo do clima é baixo aqui, menor que nos EUA, por exemplo. 

O que isso significa na prática, não sei. Temos um país muito pobre e que não pode se dar o luxo em optar por um produto mais caro, mas ambientalmente sustentável. Uma decisão difícil pra quem come “arroz com macarrão”. 

No dia a dia, na decisão de compra ou mesmo no voto essa percepção ainda não se materializa em ações muito concretas. As pessoas não votam em um vereador porque  ele faz um discurso climático, ou muito poucos votam.  

Essas decisões também vão depender de uma melhor distribuição de renda. Vejo a desigualdade como uma das dificuldades de ter envolvimento com essas questões. 

EKOS BRASIL – O que é necessário para que tomadores de decisão, públicos e privados, atuem de forma mais efetiva sobre os desafios que as mudanças climáticas trazem para o Brasil nos próximos anos?

No geral, empresas tomam decisões em função de lucro, pressão do mercado consumidor e pressões dos acionistas. 

Gente que investe pensando no longo prazo, pode estar sim preocupada com os riscos que essas empresas estão expostas, não só pela questão climática, mas pelas regras, normas e leis de um quadro geral que está se avizinhando.

E é aí que eu acho que o acordo de Paris seja relevante. Por mais que tenha se mostrado fraco, há 197 países do mundo assinando aquilo. E embora esses objetivos não sejam vinculantes, eles são medidos, reportados, avaliados, e isso gera um quadro novo e complexo. 

Alguns setores da economia global são profundamente influenciados pelo Acordo de Paris. Quem? A indústria de energia, por exemplo. Não chegamos no momento de turning point, mas já temos taxas maiores de crescimento no investimento em renováveis versus fóssil. Há uma curva que está se descolando. 

Outro setor é o automobilístico. Todas as metas do setor são de eletrificação e a briga está tão grande que as empresas estão quebrando. É um sinal muito forte de que tem que mudar. 

E vemos pressão de acionistas, consumidores e da própria regulação para mudar. 

EKOS BRASIL – Qual o fato mais positivo que você observou nos últimos meses em relação ao combate às mudanças climáticas? 

Sou otimista quando vejo tudo o que eu falei: Acordo de Paris,Pari, reações ao negacionismo, mudanças no setor de energia e automobilístico.  

O meu pessimismo é sobre a questão do tempo.

Vai dar tempo? 

Vai dar tempo de mudar o curso desse gigantesco transatlântico que é a economia global na direção da mudança dos dois graus do clima? Não vai dar. 

Há uma inércia. A economia precisa virar o leme com vários anos de antecedência.

Por isso, acho que vamos passar dos dois graus e acredito que muitos países vão sofrer demais. Teremos consequências muito sérias e tenho dúvidas de em que nível isso vai afetar a segurança global. Vejo um tensionamento político por conta de migrações, perda de território e crises de segurança alimentar. 

Torço para que os movimentos positivos segurem pelo menos perto de dois graus. Aí só o futuro pra dizer mesmo. 

 

 

 

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