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Crise hídrica: três cenários para contornar um risco iminente.

Cibele Lana 21 mar 2022

Crise hídrica: três cenários para contornar um risco iminente

Entrevista com Reginaldo Bertolo

O ano de 2014 foi marcado por uma severa crise hídrica em todo o estado de São Paulo. A população passou a acompanhar diariamente, na mídia, os índices dos reservatórios de água do estado e se mobilizou pelo consumo consciente enquanto aguardava ansiosamente pelas chuvas. 

A falta de precipitações, combinada com uma baixa reservação e com o atraso do poder público em alertar a população para diminuir o consumo foram, literalmente, a gota d’água para o agravamento da crise à época. 

Mesmo com índices pluviométricos um pouco acima da média em janeiro deste ano, de acordo com Reginaldo Bertolo, vice-diretor do Centro de Pesquisas de Águas Subterrâneas e professor associado no Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo, o risco de uma nova crise hídrica ainda existe. “Estamos entrando em um período de seca com uma reservação no (Sistema) Cantareira mais baixa que no período da crise anterior. Não temos como prever o ano, mas se tivermos um 2022 seco, vamos entrar em 2023 em uma condição pior que a de 2014”, analisa. 

Ao levantar esse alerta, Bertolo destaca que a probabilidade de novas crises é, de fato, consistente, pelo fato de haver cada vez mais fenômenos relacionados com mudanças climáticas.

“A regularidade das chuvas vem mudando e isso é perceptível. Os modelos de previsão indicam que a tendência é dos eventos de chuva serem mais espaçados com períodos de seca mais extensos. E, quando chove, a chance é maior de eventos bem intensos, com chuvas mais localizadas e na forma de tempestades. Nunca foi registrado o que aconteceu em Petrópolis, por exemplo”. 

Para o especialista, a grande questão está na irregularidade. Mesmo se chove muito, chove no lugar errado e de forma muito intensa. E, por outro lado, os grandes períodos de seca favorecem a evapotranspiração. “Esse é o problema de termos eventos climáticos extremos. Perdemos água porque não conseguimos estocar e perdemos água no período de estiagem, por evaporação”, completa. 

Desde a última crise muitas obras foram feitas para diminuir esse risco, como a interligação entre os sistemas Tietê, Cantareira e Billings. Mas é fato que nem todas as obras do mundo podem resolver um problema complexo e interdependente de diversos setores da sociedade. Além do desequilíbrio entre a oferta e a demanda, que atinge prioritariamente a quantidade de água disponível, a qualidade da nossa água também está em xeque. 

Cenas tristes dos nossos rios visivelmente poluídos são a prova de que ainda temos um longo caminho a percorrer por um saneamento adequado, que colete e trate o esgoto. “Com a ampliação do tratamento do esgoto em toda a região metropolitana de São Paulo, teríamos água limpa nos canais e a água do esgoto tratado poderia ser direcionada novamente para usos menos nobres”, explica Bertolo. 

O que fazer? 

Crises hídricas afetam toda a população e a economia de uma maneira geral. O problema começa atingindo as populações das regiões mais elevadas da cidade, onde a pressão da água é mais fraca. Mas sua extensão é a perder de vista. Chega aos produtores agrícolas e às indústrias, mesmo que muitas delas sintam o efeito retardardo por possuírem seus próprios poços. 

Os poços são mesmo uma boa opção para reduzir a demanda de água da rede, mas Bertolo alerta: “O estado oferece a outorga desses poços, o que diminui a pressão da demanda do serviço público. O problema é que de cada quatro poços, cerca de três são ilegais. É algo meio predatório e isso tem repercussões de quantidade e de qualidade”. 

Além disso, é uma opção pouco viável para o abastecimento público, pois a vazão desses reservatórios é fraca para a demanda das nossas cidades. 

Por isso, não temos uma jornada branda pela frente. De acordo com Bertolo, o que podemos vislumbrar são três cenários a longo prazo, a depender da maturidade da população e do setor público. 

O primeiro e melhor cenário seria evitar o adensamento populacional, com políticas públicas que espalhem a população criando oportunidades em outros locais, a fim de diminuir a pressão ecológica como a que vemos hoje em uma região com cerca de 20 milhões de habitantes, na Grande São Paulo. 

Um segundo cenário, completa o especialista, mais realista do que o primeiro, seria uma pressão consistente da população sobre o poder público, exigindo um maior investimento para o aproveitamento da água de forma mais racional, programas de educação para diminuir o uso per capita, criar meios de elevar significativamente as águas de reúso, de chuva e subterrâneas, e o emprego de inovação em equipamentos mais eficazes, como descargas de banheiros. 

Por fim, um cenário possível mas longe de ser economicamente e ecologicamente viável seria buscar água potável cada vez mais distante por meio de adutoras. 

Em comum, os três cenários nos deixam claro que é hora de agir: pressionar e economizar para garantir quantidade e qualidade de um bem tão precioso para a nossa existência. 

 

 

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