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As tendências e os desafios da Bioeconomia no Brasil e no mundo

Cibele Lana 20 abr 2021

As tendências e os desafios da Bioeconomia no Brasil e no mundo

Diante das várias crises que vivemos no momento – crise climática, de perda da biodiversidade e de poluição dos mares, por exemplo, – é cada vez mais comum ouvirmos a palavra bioeconomia como algo que pode nos tirar deste quadro preocupante. Esta palavra vem associada à ideia de algo novo, de uma economia nova, que seja capaz de desenvolver e introduzir nos processos produtivos uma nova lógica que associa o uso dos recursos naturais e o conhecimento. Essa nova economia também busca se aproximar das demandas de consumo de uma sociedade cada vez mais exigente em relação aos cuidados com o meio ambiente. 

A definição de bioeconomia possui certa flexibilidade porque seu desenvolvimento depende dos recursos naturais disponíveis em cada região ou país. De acordo o Global Bioeconomy Summit 2018, bioeconomia é “a produção, utilização e conservação de recursos biológicos, incluindo conhecimentos, ciência, tecnologia e inovação relacionados, para fornecer informações, produtos, processos e serviços em todos os setores econômicos, visando a uma economia sustentável”. A principal lógica da bioeconomia é encontrar novos usos para produtos de origem biológica. Porém, ainda que este conceito possa agregar especificidades relativas ao local e recursos naturais associados à bioeconomia, falta uma abordagem explicita sobre o papel da conservação das florestas tropicais neste contexto.

Mesmo que este conceito pareça novo para alguns, ele foi cunhado nos anos 70 pelo economista e matemático romeno Nicholas Georgescu-Roegen. Naquela oportunidade, Georgescu-Roeggen, vislumbrava ser possível o desenvolvimento de uma economia dentro dos parâmetros da natureza. Para ele, as pessoas não precisariam depender exclusivamente dos combustíveis fosseis uma vez que plantas e microrganismos poderiam produzir quaisquer materiais.  

Hoje, vários países do mundo têm incorporado a bioeconomia em suas estratégias de desenvolvimento dado seu potencial econômico aliado à sustentabilidade, e às demandas dos consumidores. Trabalho publicado pela OCDE indica que até 2030, a contribuição global da biotecnologia alcançará mais de US$ 1 trilhão distribuídos entre os setores de saúde, produção primária e industrial. 

Na União Europeia, inciativas inovadoras relacionadas à bioeconomia ganharam espaço já nos anos 2000. Na oportunidade, o bloco europeu já apostava na exploração dos recursos biológicos antevendo a solução de problemas ambientais, o que culminou com o lançamento, em 2012, de sua Estratégia Regional de Bioeconomia, atualizada em 2018. Países como a Alemanha, França, Reino Unido, Itália, Finlândia, Suécia e outros, possuem Planos Nacionais de Bioeconomia. Os Estados Unidos são outro expoente desta tendência. 

Dados da Comissão Europeia apontam que setores ligados à Bioeconomia nesta região movimentam 2,3 trilhões de euros/ano e geram 18 milhões de empregos (ou 8,3% do mercado), enquanto a contribuição para o PIB europeu é de 620 bilhões de euros (4% do PIB regional). 

Um reforço importante para o avanço da bioeconomia vem da iniciativa “European Green Deal” que reposiciona a relação do bloco com outros países com os quais têm relações comerciais. Esta iniciativa prevê medidas para proteção de florestas tropicais, incentivando a aquisição e consumo de commodities provenientes de cadeias de abastecimento livres de desmatamento. 

Este movimento já traz reflexos para o Brasil. Está em discussão no Parlamento Europeu projeto de lei para responsabilizar civil e penalmente empresas importadoras de commodities de áreas desmatadas. A demonstração prática recente desta iniciativa se deu em junho de 2020, quando 29 instituições financeiras, entre fundos de pensão e bancos que juntos somam quase US$ 3,75 trilhões sob sua gestão, enviaram carta ao governo brasileiro, demonstrando preocupação com o desmonte das políticas ambientais e o avanço significativo do desmatamento. 

E no Brasil?

Possuidor de um território com mais de 8,5 milhões de km2, onde se inserem sete biomas (incluindo o mar) que abrigam 20% do número total de espécies existentes (116 mil espécies de animais e 55 mil espécies de plantas) e onde está a maior floresta tropical do planeta, o Brasil desponta como um país de enorme potencial para o desenvolvimento da bioeconomia. Por estas características também se vislumbram novos ganhos para a economia, para o desenvolvimento científico, a conservação da biodiversidade e valorização dos conhecimentos tradicionais. O pesquisador José Vitor Bomtempo Martins, Coordenador do Grupo de estudos em Bioeconomia da UFRJ estimou que a bioeconomia representava U$ 286 bilhões no Brasil em 2016, ou perto de 14% do PIB

Além dos recursos naturais favoráveis ao desenvolvimento da bioeconomia, o Brasil também possui outros atributos importantes como a presença de uma agricultura desenvolvida, um grande potencial para gerar energia eólica e solar e experiências bem sucedida em biocombustíveis. Estes setores já mostram resultados interessantes e alguns exemplos correntes como os abaixo listados: 

 

  • Cana-de–açúcar o etanol (inclusive de 2a geração E2G – mais eficiente e com menos emissões de C), energia térmica (o bagaço já contribui com 8% da matriz energética brasileira), e o esqualeno que é um antioxidante e é utilizado como óleo hidratante; 

 

  • Florestas plantadas a lignina pode substituir o benzeno e estireno (fosseis) na produção de plástico, para a fabricação de copos, embalagens e brinquedos, por exemplo; A nanocelulose (extraída das fibras da madeira) confere leveza e grande resistência mecânica podendo ser aplicada na construção civil, automotiva, aeroespacial, farmacêutica e alimentícia. A chamada “Madeira engenheirada” pode sustentar colunas de lajes na construção civil.

 

  • Combustíveis – Biogás  já existem 3 termelétricas no Brasil que utilizam o lixo para a produção de gás em SP, BA e RS. Também pode servir como combustível para caminhões (biometano) e para a siderurgia. Segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP), 18% dos combustíveis consumidos no país são renováveis. Um passo importante na descarbonização do setor de transportes e a geração de créditos de carbono (CBIOs) é o RenovaBio, que visa incentivar a produção destes tipos de biocombustíveis. 

 

  • Cosméticos vários produtos já estão no mercado, sendo este um dos setores da indústria com grande potencial de desenvolvimento de novos produtos na lógica da Bioeconomia.

 

Mas, é necessário que o país invista em outros setores para o pleno desenvolvimento da bioeconomia, que possam incluir outros atributos da nossa biodiversidade. A floresta em pé́, por exemplo, tem um valor que ainda desconhecemos por completo. Além dos serviços ecossistêmicos prestados ao planeta, como captação de CO2, manutenção do regime de chuvas, conservação da biodiversidade, entre tantos outros benefícios, há incontáveis potencialidades que podem se transformam em riquezas, sem agressão à natureza. 

Bioeconomia e Biodiversidade da Amazônia  

Atualmente, em alguns círculos de discussões (técnico-político-filosófico e de desenvolvimento sustentável), o bioma amazônico, onde habitam 25 milhões de pessoas, parece o lócus privilegiado para o desenvolvimento da bioeconomia. Manter este bioma conservado é, portanto, manter uma vantagem comparativa única para o Brasil. Mas, a forma de transformar esta vantagem em ativos econômicos ainda demandará tempo. 

Entende-se que o desenvolvimento econômico, que tem na inovação em bioeconomia sua lógica, terá que transformar as formas correntes de cadeias de valor e mercados de produtos. É preciso ter como pano de fundo a conservação da biodiversidade, evitando sua simplificação ao mesmo tempo que se deve promover a expansão dos territórios conservados. Em igual medida, é imprescindível focar na melhoria do bem-estar das populações que vivem na floresta e dela retiram sua sobrevivência material, cultural e espiritual. A bioeconomia precisa ser ambientalmente comprometida, equitativa e socialmente inclusiva

Para que este foco da Bioeconomia seja alcançado, é importante distingui-lo do viés conceitual utilizado nas economias industrializadas, baseado principalmente na substituição de materiais e combustíveis fósseis, promoção do setor agrícola, e de energias alternativas, que focam na redução de emissões de gases de efeito estufa. Isto se mostra particularmente relevante para que as políticas públicas por vir, evitem fortalecer atividades que levem ao desmatamento e concentração de riqueza e renda. 

Gargalos

Para que o potencial da Bioeconomia se materialize, alguns gargalos devem ser enfrentados, tanto aqueles de caráter geral, quanto os específicos para a região amazônica e outros biomas.

De forma geral, os problemas apontados são: falta de mão de obra qualificada; coordenação política; inexistência de um Plano Nacional de Bioeconomia – existindo apenas ações voltadas a setores específicos com visão incompleta e fragmentada; excesso de burocracia que estende sobremaneira o tempo para a realização de pesquisas, e falta de sinergia entre iniciativa privada, governo e academia.

Já no tocante à região amazônica, somados aos gargalos gerais há limitações aos produtos florestais extrativos, decorrentes das suas próprias características assim como da própria região: alta perecibilidade dos produtos, dificuldades logísticas, instabilidades na produção (volume, qualidade, etc.), mercado pouco organizado e baixa tecnologia. Estas características reforçam a presença de atravessadores, dificultando o estabelecimento de canais diretos com os produtores, o que por vezes afasta potenciais compradores e desincentiva a melhoria da própria cadeia produtiva. 

Portanto, para que nosso potencial natural possa aumentar os ganhos com a bioeconomia, há que se olhar com cuidado para o potencial e capacidade de cada setor, de forma que sejam respeitados e incentivados o cuidado com nossos biomas e sua biodiversidade e que sejam respeitados os direitos e conhecimentos das populações tradicionais.  

Por Maria Cecilia Wey de Brito, Instituto Ekos Brasil.

 

Fontes 

Especial Guia Exame de Sustentabilidade   – a Economia do Futuro (13/11/2019)

Instituto Escolhas e IRICE (Instituto de Relações Internacionais & Comércio Exterior). Agenda para o destravamento da Bioeconomia. 2019

Instituto Escolhas – Revista – Interesse Nacional – ano 13 Edição especial 01 – Bioeconomia – Ago 2020

Revista Página 22 News – Amazônia Legal em Dados | Bioeconomia | ESG e exploração | Mulheres e Clima (fevereiro de 2021)

 

 

 

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